Estou vivendo em Magoma desde julho e estamos em uma fase muito significativa do projeto, vendo tudo que planejamos (e sonhamos) acontecer e mantendo os olhos abertos pra fazer os ajustes necessários. Fase de trabalho duro e de muito sol na cabeça.
Melancias, pimentões e ngogwe (espécie de berinjela africana) serão colhidos em janeiro. Todas as projeções de mercado, feitas e checadas inúmeras vezes com as 3 Pedras e com os técnicos em agricultura, são bastante promissoras. Kristina e eu ficamos hesitantes com tanto otimismo e buscamos garantias e contatos no mercado para viabilizar as projeções.
Para ter um projeto bem resolvido temos que ajustar resultados, corrigir os erros e melhorar o que pode ser melhorado equilibrando os valores que estamos propondo com a necessidade prática de ação (vou explicar um pouco melhor esta frase em blog sobre as melancias).
Se eu voltasse em dezembro nós não teríamos a chance de acompanhar a venda da colheita e por experiência anterior (Projeto Korogwe, ano passado) sabemos que resultados não colhidos simultaneamente às frutas são resultados perdidos. E como me foi lembrado esta semana, este pedaço do mundo não vive tantos problemas há centenas de anos à toa: muitos aspectos contribuem simultaneamente para as dificuldades. Ou seja, muita coisa pode dar errado.
Nossos amigos em Magoma estão felizes com a minha decisão de ficar mais tempo, agradecem-me frequentemente. Pergunto-me por que exatamente estão me agradecendo, até me lembrar que todos consideram a vida aqui difícil e provavelmente me agradecem pela disponibilidade em viver uma vida que eles mesmos não viveriam se tivessem escolha.
A ingenuidade de Magoma pinta um mundo muito melhor no mundo wazungu. E não há distinção de países, continentes ou idiomas; todo o mundo fora da Tanzânia é um mundo pasteurizado pela falta de referências ou informação.
As pessoas não sabem nada sobre mendigos nas ruas de São Paulo, sobre tiroteios nos morros do Rio ou sobre a seca no sertão de Pernambuco. Tampouco sabem sobre bombas no Iraque ou fome no Haiti. Qualquer país do mundo terá tratores disponíveis, casas com energia elétrica e dólares ao esticar da mão.
Eu mostro fotos, mas fotos sempre imobilizam cenas que são mais duras com som e movimento. Minhas fotos são o paraíso.
Acho que me agradecem porque tomo banho de caneca, passo o dia na shamba debaixo de sol escaldante e cozinho com querosene. Acho que me agradecem por estar marrom de poeira a cada passo que dou fora de casa ou por beber água marrom (faço chá para mascarar a aparência e o gosto da água do rio).
A verdade é que me acostumei. Banhos de caneca refrescam e limpam meu corpo. Eu gosto do sol, ainda que minha pele fique mais manchada a cada dia e eu não goste das manchas. O cheiro de querosene é ignorado pelo meu nariz e a poeira vai embora com aquela caneca que descrevi logo atrás. Chá me faz sentir gosto de Brasil a cada gole e quando meu estoque de chá brasileiro acabar, muito em breve, farei chá com ervas locais e me sentirei super saudável.
Claro, geladeira e forno me trariam um mundo de possibilidades, mas temos sido bastante criativas na cozinha (pena que não haja criatividade capaz de fazer sorvete sem refrigeração...). Até o banheiro buraco no chão me parece simpático hoje em dia (ainda que a falta de um sistema efetivo de escoamento me incomode com certa frequência).
De qualquer forma nada disso importa. Estou aqui pra trabalhar naquela frase "muita coisa pode dar errado" e torná-la um "vamos fazer isso dar certo".
Magoma, vamos fazer isso dar certo juntos!
Querida Ana,
ResponderExcluirQuanto mais tempo passa, mais eu fico admirada e orgulhosa de vc. Força! Nancy