domingo, 18 de julho de 2010

Magoma - 4 dias

Estamos em Magoma há 4 dias e, apesar de termos conseguido nos conectar no primeiro dia, não existe conexão. Estou sempre tentando carregar notícias e fotos, mas tem sido uma tarefa pouco produtiva.
Continuo chateada por não falar Swahili e tentando aprender no dia-a-dia. Nos últimos 2 dias considero que meu entendimento melhorou significativamente mas ainda está muito longe do ideal. Tenho tentando estudar um pouco de gramática e aprender alguns verbos, vamos ver como me saio.
Nos últimos 4 dias fizemos coisas que eu achei que demoraríamos duas semanas para fazer. Fomos à escola primária, secundária (3km da vila), ao hospital (mais adequado dizer posto de saúde), ao mercado (uma espécie de feira livre onde as mulheres vendem frutas e legumes no chão), às plantações de arroz, de milho e de sisal, aos 3 lagos da região, a 4 vilarejos (e passamos por alguns outros a caminho de Mashewa), à vila de Mashewa, à administração de Magoma, a uma festa na World Vision (ONG que atua na região há 10 anos) e andamos muito por Makangara (vila em que estamos morando).
Um ponto importante foi a descoberta de que as escolas possuem grandes terras não utilizadas, nas quais podemos trabalhar. Especialmente a escola primária, que se destaca pela excelência na região, pareceu uma ótima opção de parceria e um território neutro, no qual nosso trabalho beneficiaria cristãos, muçulmanos e qualquer outra religião. E me atrai bastante a idéia de trabalhar de uma forma que beneficie as crianças e crie uma nova forma de pensar.
A estrutura das escolas é bastante precária, a escola secundária tem 5 professores para 540 alunos. Isso porque a região não é atraente para os professores, que não têm vontade de trabalhar e viver em solo tão árido. Algumas crianças caminham 8km para chegar à escola e mais 8km para voltar pra casa. O cansaço prejudica o aprendizado e faz com que o número de faltas seja bastante significativo. Com tudo isso, para cada 500 alunos estudando, apenas 1 prossegue além da escola secundária.
Além disso, não há energia elétrica e ainda que as aulas ocorram durante o dia eu acho que luz sempre ajuda. O abastecimento de água também é falho. As escolas não oferecem refeições e fico imaginando como seria bom garantir que as crianças tenham alimentação adequada enquanto estudam, já que muitas não têm o que comer quando voltam pra casa. Seria também uma ótima oportunidade para aumentar o valor nutricional das refeições.
A área que estamos trabalhando abrange 25 vilarejos e cerca de 50.000 pessoas (senso de 2002), com equilíbrio entre homens e mulheres.
Visitar as plantações de arroz foi bastante divertido, caminhamos na lama, pois a plantação de arroz fica sobre um dos lagos, que tem pouca água por causa da seca. Aparentemente todos os lagos daqui têm crocodilos, mamba em Kiswahili, mas não tivemos a chance de ver nenhum. No Lago Kilemele as pessoas nem mesmo pescam, com medo dos mambas. Eu tirei fotos, convidei os crocodilos a sorrirem para mim, mas aparentemente eles não estão tão curiosos com as mzungu (brancas) como todas as pessoas. Mas essa história ainda terá novos capítulos, espero tirar pelo menos uma foto (com o super zoom da minha máquina, claro) de um mamba até dezembro.
É comum vermos crianças trabalhando, tanto na plantação de arroz como na de milho. Um dos lugares que me partiu o coração foi a “indústria de tijolos”. Na verdade é um descampado em que crianças fazem centenas de tijolos de lama, que posteriormente serão queimados nos fornos a carvão. É um lugar em que, em minha opinião, nenhuma criança deveria trabalhar, especialmente quando sabemos que estão deixando de ir à escola para isso. Cada tijolo que fazem vale TSH20 e cada tijolo queimado é vendido por TSH72 a TSH100 – lembrem que US$1 = TSH1167.
A ida a Mashewa, vilarejo que fica alguns km à frente de Magoma, foi deliciosa. Ali fica o lago Kwata, lindíssimo e gigantesco. Este sim tem bastante água e é usado para pesca, mas até mesmo ele seca no verão. O pôr-do-sol em Mashewa, assim como todo o trajeto em pikipiki (motocicletas), foi extremamente prazeroso. Eu estava particularmente interessada em ir a Mashewa porque Yakub (nosso parceiro tanzaniano) sempre demonstrou interesse em me levar até lá. De alguma forma seu coração está em Mashewa – ficou fácil entender por que.
Magoma é o lugar mais árido que visitamos, a seca é severa aqui. O sol castiga e isso é visível no rosto das pessoas. A falta de chuva prejudica a colheita e a alimentação é basicamente milho (maize em inglês, aquele milho branquinho quase sem gosto). Com milho e água, as pessoas fazem ugali, uma espécie de cuscuz. A água tem cheiro e gosto, é barrosa. E o ugali não tem qualquer tempero, deixando a refeição completamente insossa.
Temos agora a chance de cozinhar, mas sinceramente não é uma tarefa fácil já que temos apenas uma boca de fogareiro que cheira a querosene. Preparar uma refeição completinha leva tempo, pois temos que cozinhar uma coisa de cada vez. Estou aproveitando para tentar emagrecer os quilos que ganhei durante a arrecadação e preparação da viagem, tarefa que ainda não se mostrou produtiva. Nossa alimentação é basicamente composta de carboidratos. E minhas barrinhas de cereal brasileiras têm sido meu porto seguro.
Hoje fui a um funeral na vila. Funeral cristão com pessoas cantando. Lá encontrei meu babo (avô) e minha bibi (avó) tanzanianos. Confesso que foi bom ter essas figuras doces por perto.
Amanhã é domingo e vamos à missa anglicana, que começa às 7h30. Serão duas horas ouvindo preces em Swahili sem entender uma palavra e sem poder demonstrar cansaço. Na próxima semana será a vez da missa católica e em algum momento pretendo ir à celebração muçulmana, que não faço idéia de como é ou se posso participar sendo mulher (não sei nem mesmo se existe uma “missa” muçulmana, mas me informarei sobre isso com Yakub). Tudo para ser parte da comunidade como um todo e não de apenas um segmento.
A festa da World Vision foi uma despedida para 3 pessoas que estavam deixando a equipe. Fizeram-me cantar em português (Águas de Março me pareceu apropriada), tive a oportunidade de falar um pouco sobre minhas razões para estar aqui e ainda dancei uma música. Foi divertido, finalmente minha primeira dança na Tanzânia (basicamente um passinho pra direita e outro pra esquerda).
Outro bom momento foi uma caminhada que fizemos na montanha aqui ao lado. Ver os vilarejos e o lago do alto foi lindo.
Alguns problemas que prejudicam o desenvolvimento tanzaniano: a energia elétrica, que é originada em usinas hidrelétricas, é cara e inconstante. Falta luz pelo menos uma vez todos os dias. Em Magoma, quase nenhuma casa tem energia elétrica, eu diria que no máximo 10%.
A conexão com a internet não existe na vila. Enviei um email do aeroporto de Londres, quando estava a caminho de Dar es Salaam, para Maria, funcionária da World Vision em cuja casa estou morando. Ela leu o email 15 dias depois. Isso significa que mesmo uma ONG estruturada, que trabalha aqui há 10 anos, trabalha desconectada – não há computadores na World Vision.
Outra questão é que todas as terras pertencem ao governo. Isso significa que você pode fazer investimentos em uma área e a ter desapropriada sem qualquer aviso. Muitas pessoas dizem que esse é o maior entrave ao desenvolvimento tanzaniano.
Desculpem o longo post e obrigada a todos que o leram até aqui. Vou tentar carregar imagens no Flickr e postá-las, para deixar o blog mais interessante.
Saudades de todos! Tutaonana (tchau)!

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