Estou a escrever do escuro no quarto do Econolodge, hotel em Dar em que já me hospedei tantas vezes que tem um "que" de casa. As pessoas me conhecem, desde o staff até os que moram na pequena rua que leva ao hotel, e as figuras desdentadas e pobres não me assustam, ao contrário, me aceitam.
Dormi o dia inteiro, sensação que em 1 ano e meio de Tanzânia tive pela primeira vez. Estou em Dar esperando o Sam, que está em Pangani com a namorada e me encontrará aqui na terça para que eu finalmente a conheça pouco antes da sua partida, fruto de infinitas conversas em nossas noites de trabalho. Então seguiremos para Korogwe juntos, na quarta, e ele me ajudará a carregar minha mala, que mal consigo levantar de tão pesada, cheia de comida brasileira e quitutes saudáveis que me ajudarão a encontrar minha forma perdida (e contentar minha alma saudosa).
Estou no escuro porque quero, desta vez temos luz aqui em Dar, e estava a ler o blog do Gonçalo, amigo português que conheci em Nairobi e que se aproxima do final de uma viagem magnífica pela África. Confesso que sempre que leio seu blog sinto as formigas se mexendo na sola de meus pés e tenho muita vontade de reaver meu espírito mochileiro e seguir o sol. Aí respiro fundo e me lembro porque estou aqui, vejo algumas fotos de Magoma (sim, ainda dona do meu coração) e me aquieto. A verdade é que não sei por quanto tempo conseguirei me aquietar, mas minhas Havaianas sem sola têm me mantido muito firme na busca desse meu destino.
A viagem ao Brasil foi incrível e comer pão de queijo (duro, depois de 2 dias de viagem) no quarto do hotel me traz à boca o sabor do meu país. A última vez que estive no Brasil foi estranha, eu não estava em um bom momento e foi uma viagem de despedida: de Magoma, da minha avó, do meu trabalho como Coordenadora de Projeto e de uma imagem que eu tinha na minha cabeça de como seria voltar pra casa depois de tanto tempo. Infantilmente criamos conceitos de sucessos e fracassos e esperamos que apenas os sucessos sejam vistos quando regressamos de uma experiência tão definitiva. Ao olhar para o espelho e ver os fracassos refletidos senti vergonha e quis me esconder.
Só que o crescimento que vim viver na Tanzânia me ensinou o valor dos fracassos no caminho do sucesso e o que significa aprender, nem na escola nem no livro, mas na alma, na carne.
O Brasil é minha casa, finalmente sinto isso depois dos últimos dez dias. É o país cuja bandeira me enche os olhos de lágrimas e cujos defeitos me irritam acima de tudo. É minha saudades, meu sabor, minha música. Minha alma de brasileira em um corpo que chacoalha sem medo.
A Tanzânia é o país em que cumpro minha missão, em que me fiz aceitar e sou lenda, mais do que sou eu. É minha flexibilidade e meu tapa na cara, onde eu sou menos importante pra mim mesma – no bom e no mau sentido.
Meu coração está, neste escuro quarto de hotel, em algum lugar entre os dois mundos. As saudades apertam, o dever chama e eu cresço enquanto me sinto pequena e me escondo enquanto me exponho.
Aqui sou alma, sou carne e sou mundo.
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