segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Growing a new generation

Como é Magoma:
Este lugar que se tornou minha casa tem terra vermelha, vento, sol forte e lama quando chove. Às vezes tem água, que as mulheres carregam em baldes sobre a cabeça. Às vezes não tem (estamos sem água há 2 dias e em breve terei que ir ao rio abastecer meu balde).
E é neste cenário que 813 crianças vão à escola todos os dias, da primeira à sétima série.
São 16 professores para 813 crianças e, acreditem, esta é uma boa média (a escola secundária tem 5 professores para 540 estudantes). A escola não tem energia elétrica e só recebe água duas horas por dia. Os uniformes brancos não são muito brancos (aqui, cada vez que pisamos fora de casa estamos sujos de poeira, não tem jeito. E a água que lava essa poeira é marrom, vem do rio).
As crianças estudam das 7h00 às 14h00 sem comer nada. Muitas delas não encontram refeições quando voltam pra casa também. Falar em nutrição é utopia pura.

Foi neste cenário que começamos a desenvolver o projeto. Pensamos em oferecer refeições aos estudantes. Pensamos em aumentar o valor nutricional do que eles estão comendo. Pensamos, principalmente, em proporcionar conhecimento para que esses estudantes possam buscar novos caminhos para batalhar pelos seus sonhos (e ajudar suas famílias a trabalhar sua terra de forma mais apurada).

Assim nasce o Projeto Magoma :)
A escola tem um pedaço de terra árida que está sendo subutilizada. Estamos trabalhando nesta terra para plantar árvores frutíferas, árvores para reflorestamento e árvores repelentes (se alguém conhecer alguma me avise, malária é um problemão aqui e seria de grande ajuda).
Primeiro passo: plantar uma cerca - viva de sisal (idéia do meu herói, John Mntambo) para que as cabras e vacas não comam as árvores.

A escola acabou de alugar um pedaço de terra fértil perto do rio, 2 acres. Neste pedaço de terra vamos plantar melancias, berinjela africana e pimentão (primeira temporada) e cebolas, espinafre e repolho (segunda temporada). Estamos trabalhando esta projeção para garantir:
a) Que os estudantes tenham a oportunidade de receber treinamento e aprender a lidar com diferentes culturas
b) Que o projeto seja lucrativo e proporcione dinheiro para a escola.
Com este dinheiro, estamos montando o orçamento para um Programa de Alimentação, uma refeição por dia para cada estudante.
Próximo passo: o primeiro passo já foi dado, escolher a terra e negociar o contrato. A terra começará a ser limpa amanhã, o que levará uma semana. Depois disso vamos contratar um trator para preparar o solo.

Temos um sem fim de sonhos e objetivos dentro deste projeto. Mas vamos começar assim:
a) 1 escola primária com 813 estudantes e 16 professores
b) 1 fazenda produtiva e lucrativa para retorno de curto prazo (assim esperamos)
c) 1 fazenda de árvores para retorno de longo prazo (que ajudará a estreitar a relação das pessoas com o meio-ambiente)
d) Treinamento para os estudantes sobre como lidar com o solo, melhores práticas de agricultura, como irrigar a área, como dividir o trabalho entre homens e mulheres
e) Treinamento para os estudantes sobre como planejar sua plantação orientando-a para o mercado: fazendo projeções de lucros e custos, escolhendo a opção mais atrativa e acessando os melhores mercados para vender a produção.
f) Um Programa de Merenda Escolar com uma refeição diária para cada estudante, financiado com dinheiro gerado pela própria escola e seus estudantes (e, portanto, sustentável)
A partir daí temos muitos caminhos para crescer, em número de escolas e em possibilidades. Mas este é o começo que estamos todos construindo juntos.
Se tudo der certo teremos uma Magoma com novas possibilidades em breve. E os jovens não precisarão deixar Magoma porque terão possibilidades de encarar suas fazendas como um negócio que pode gerar segurança alimentar e segurança financeira.

Dedicamos muito tempo a buscar as pessoas certas na comunidade e envolvê-las no projeto. Acho que temos algumas pessoas fantásticas trabalhando juntas, sobre as quais vou escrever mais, em breve.
E já temos um slogan, criado por um de nossos parceiros locais, Mzee Francis:
The Magoma Project – Growing a new Generation :)

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Estrelas cadentes

Outro dia o coordenador de projeto da World Vision Magoma veio jantar aqui conosco. Não acontece com freqüência termos visita para o jantar e confesso que acho divertido ainda que seja bem trabalhoso cozinhar com uma única boca de fogareiro movido a querosene e sem geladeira ou forno.
Precisávamos de tomates (ele avisou que viria quase na hora do jantar e não há supermercados em Magoma). Maria me disse que há uma vendinha aqui perto, eu não conhecia, então fomos juntas. Na verdade é uma casa, em que a dona vende tomates, cebolas e ovos na janela. A noite estava linda, magnífica na verdade.
Infelizmente não tenho aproveitado muito as noites de Magoma, não há muito que fazer, especialmente para mulheres. Como não há iluminação pública e 90% das casas não têm energia elétrica, é possível ver milhões de estrelas.
Quando a lua está cheia ando sem lanterna, mas quando não há lua vou com a lanterna do celular, já que há buracos para queimar o lixo espalhados pelo chão e não seria muito agradável cair em um deles.

Nessa noite, com Maria, comentei que adoraria ver uma estrela cadente. E descobri que Maria não faz idéia do que é uma estrela cadente...
Primeiro ela me perguntou se a estrela cairia até o chão. Depois ficou olhando pro céu, admirada.
Não saber o que é uma estrela cadente significa nunca ter feito um pedido para uma estrela cadente. Em Magoma as pessoas não fazem pedidos para estrelas, não sopram velas de aniversário, sonhos são raros. E isso sempre me deixa triste porque é um dos símbolos da falta de perspectiva, da ausência de desejos e tradições doces e frívolas. A vida não tem essa leveza e provavelmente ninguém acreditaria que um pedido a uma estrela possa se realizar.

Eu estou aqui, batalhando por Magoma. E buscando pessoas de Magoma dispostas a batalhar por Magoma também. Encontrei algumas, mas todas tão temporárias quanto eu. Tanzanianos não gostam de Magoma e não desejam estar aqui, especialmente os jovens. Sempre que viajamos e dizemos a qualquer pessoa que vivemos em Magoma ouvimos risadas seguidas de “O que você come?”, “Você bebe a água?”.
Para encontrar jovens magomenses dispostos a lutar por uma Magoma melhor, precisamos primeiro criar condições para que viver em Magoma seja uma opção, não falta de perspectivas. Se conseguirmos mostrar aos jovens de Magoma novos caminhos ou, melhor ainda, lhes mostrar uma forma de encontrá-los por conta própria, talvez tenhamos uma nova realidade dominando o espaço. Espero que essa nova realidade nos traga um pouco de criatividade, certamente ajudaria muito.

Eu vou seguindo minha vida e procurando minha estrela cadente para fazer meu pedido: desejo que as pessoas de Magoma descubram que existem estrelas cadentes nesse lindo céu negro e comecem a fazer pedidos e correr atrás de seus sonhos. Como eu estou correndo atrás do meu.